HISTÓRICO
Conforme consta na certidão de Tombamento “O Imóvel Fortim dos Emboabas, situado à rua Ricardo Geraldo dos Santos, n° 104 é um bem citado isoladamente no tombamento do conjunto arquitetônico e urbanístico de São João del Rei, tombado pelo IPHAN de acordo com o processo n 68-T-38, inscrição n 01 Livro de Belas Artes, volume I, folha 02, em 04/03/1938 e protegido pelo decreto n 25 de 30/11/1937.”
Em 2011 a Universidade Federal de São João Del Rei recebeu em doação um casarão de 1709, conhecido como Fortim dos Emboabas, contendo a coleção de Arte Popular do doador do imóvel, o Almirante Max Justo Guedes, que deixou uma carta de intenções na qual expõe seu desejo de que o casarão se transforme em um local para receber visitações.
USO ATUAL DO IMÓVEL
No casarão do século XVIII, conhecido como Fortim dos Emboabas atualmente está funcionando o Centro de Referência da Cultura Popular Max Justo Guedes da UFSJ. No imóvel são desenvolvidas atividades no formato de oficinas para as crianças, adolescentes e adultos do bairro. O Centro de Referência é composto pelo Museu do Barro e pelo Museu de Vivências.
A PROPOSTA DE IMPLANTAÇÃO DO CENTRO DE REFERÊNCIA DA CULTURA POPULAR
Com o objetivo de atender as demandas do bairro, o Centro de Referência da Cultura Popular Max Justo Guedes da UFSJ se organiza através de dois pontos de Memória:
Primeiro eixo: Museu de Vivências visa trabalhar a noção de lugar, identidade e questões ligadas às relações étnico-raciais – já que a maioria da população do bairro consiste de afrodescendentes. Esse ponto de memória trabalha, fundamentalmente, com o patrimônio imaterial. O nosso ponto de memória encontra-se alinhado ao decreto número 3551 de 04 de agosto de 2000 - que “Insitui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial e dá outras providências. ” São considerados patrimônio imaterial: Os Saberes e os fazeres “enraizados no cotidiano das comunidades” ; “Os rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social”; “As Formas de Expressão - manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas”; Os lugares: “mercados, feiras, santuários, praças e demais espaços onde se concentram e reproduzem práticas culturais coletivas” (Cf. Decreto no 3551 de 04 de agosto de 2000. Em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=3589A4E7C1CACFA7473B1BC685DE6AD2.proposicoesWebExterno1?codteor=355911&filename=LegislacaoCitada+-INC+6879/2005. (Acesso em 03 de novembro de 2020).
Tendo em vista esse tipo de patrimônio, o Núcleo
Museu de vivência busca:
1. Promover
as vivências, através de oficinas com as crianças do bairro, de forma a manter
vivo esse tipo de patrimônio;
2. Divulgar
os saberes e fazeres da comunidade através de oficinas de contação de história,
da produção de documentários e produção de cartilhas;
3. Registrar
os Grupos de religiosidade popular (Congado, Folia de Reis, Pastorinhas etc.);
4. Promover atividades de educação patrimonial junto com as escolas municipais.
O
patrimônio imaterial encontra o seu
lugar mais próprio na cultura popular e na espontaneidade do cotidiano. No
dia-a-dia do homem, na relação que ele estabelece com o seu corpo e a sua alma.
A relação com o corpo se evidencia de imediato nas relações que o homem
estabelece com alimentos, utensílios de cozinha, plantas medicinais etc.; e de
modo mediado com a sua moradia (no modo de fazer os móveis e objetos
utilizados para a composição e construção de uma casa - como por exemplo: o adobe, o pau-a-pique);
com o trabalho (cestaria, balaios, arreios, selas etc.); com a beleza (os
bordados, objetos de toucador etc.). A relação com a alma se revela para o
homem nos seus objetos de fé (santos, festas populares e os seus adereços
etc.); na necessidade do lúdico
(brinquedos, brincadeiras etc.); nas narrativas orais que traduzem diferentes
dimensões e paixões da sua alma. Diferentemente da cultura erudita, que toma a
si mesma como objeto de reflexão e que se encontra, de certa forma, “na
erudição livresca”, a cultura popular se mantém resguardada na sua própria
vivência. Aprende-se a sentir a própria vida que passa despercebida, esquecida
no seio dessas manifestações populares. Esse esquecimento (ou essa falta de
tematização, de reflexão sobre si mesma) é que dá força ao cotidiano.
Desde a sua implantação, o Museu de vivências catalogou os grupos de cultura popular de São João del Rei; fez o levantamento, através de entrevistas, dos saberes e fazeres que deu origem as Cartilhas Sobre Festas Religiosas da Região, de Culinária e a Cartilha de Causos – que foram distribuídas para as escolas da região. Também foi produzido um documentário com as lideranças e moradores do Bairro Alto das Mercês intitulado Memória e Esquecimento; A cartilha das oficinas ministradas para as crianças da Escola Municipal Doutor Kleber Filgueiras e a Cartilha sobre o Negro e o Racismo no Brasil.
Segundo eixo: Museu do Barro visa
a consolidação do Grupo permanente de trabalho em Arte e Cerâmica visando a
capacitação e qualificação dos moradores e estudantes visando à formação para o
trabalho e a geração de renda. E tem por objetivos: preservar, pesquisar,
divulgar, valorizar e difundir a memória, os valores históricos, artísticos e
culturais, e o patrimônio material e imaterial ligados à produção da cerâmica.
A implantação do Museu do Barro surge a partir da coleção de obras de arte doada pelo Almirante, composta em peso por cerâmicas filiadas à tradições indígenas e populares de várias regiões do Brasil, somando ao todo 115 peças. O primeiro projeto consistiu em catalogar as peças do acervo do Fortim dos Emboabas, buscando informações sobre autoria e origem, e necessidades de restauração. As informações sobre o acervo de cerâmicas compõem um conjunto de fichas catalográficas com informações sobre cada uma, arquivo disponível em formato impresso e digital para pesquisas e consultas no blog do Museu do Barro. Textos informativos foram elaborados para acompanhar cada lote pesquisado e foi preparada uma equipe para oferecer visitas guiadas regularmente, o que aconteceu de fevereiro até o casarão ser interditado no final de junho de 2013 pela necessidade de reforma do imóvel, que passou a oferecer riscos ao público visitante.
Acreditamos que as ações a serem
desenvolvidas pelos dois eixos que integram o Centro de Referência da Cultura
Popular atendam a LEI Nº 11.906, DE 20 DE JANEIRO DE 2009 que cria o Instituto
Brasileiro de Museus – IBRAM, e que prevê no seu Capítulo Primeiro, artigo
segundo:
“I – as instituições
museológicas: os centros culturais e de práticas sociais, colocadas a serviço
da sociedade e de seu desenvolvimento, que possuem acervos e exposições abertas
ao público, com o objetivo de propiciar a ampliação do campo de possibilidades
de construção identitária, a percepção crítica da realidade cultural
brasileira, o estímulo à produção do conhecimento e à produção de novas
oportunidades de lazer, tendo ainda as seguintes características básicas: a) a
vocação para a comunicação, investigação, interpretação, documentação e
preservação de testemunhos culturais e naturais (grifo nosso); b) o trabalho
permanente com o patrimônio cultural; c) o desenvolvimento de programas,
projetos e ações que utilizem o patrimônio cultural como recurso educacional e
de inclusão social (grifo nosso); e d) o compromisso com a gestão democrática e
participativa;”
A proposta de nosso programa de
extensão é a da consolidação de um museu vivo que assume responsabilidade
social, e que guarda seu acervo como um repositório de referências culturais,
históricas e identitárias, que está vivo como elemento multiplicador de saberes
e fazeres associados àqueles objetos.
Formato: museu de território
Desde 2012 temos atuado
ininterruptamente no espaço do Fortim oferecendo oficinas e auxiliando na
organização desse novo espaço Institucional. O objetivo dessa proposta é dar
continuidade às nossas ações e ajudar a organizar o espaço dentro da
perspectiva de um museu de território.
O território pode ser entendido enquanto um museu a partir das
perspectivas abertas pelo movimento denominado Nova Museologia e seu
desdobramento acadêmico chamado Sociomuseologia. Isso nos permite compreender o
patrimônio de uma maneira mais ampla, a partir de uma compreensão que contemple
a musealização do território enquanto estratégia de administração da memória e
instrumento de desenvolvimento social. Essa proposta de musealização do
território visa despertar nos indivíduos um conhecimento crítico e uma ação
transformadora da sociedade. (OLIVEIRA, 2015, p.34)
Dentro dessa perspectiva teórica, o território
para nós em questão é o do povo afrodescendente que constitui a maioria dos
moradores do bairro Alto das Mercês, cuja cultura se expressa na religião, nos
saberes e fazeres enraizados na cultura africana. Assim, mesclados com a
cultura de outros povos que ajudaram a povoar São João del-Rei, constituem um
patrimônio cultural único. O nosso Programa busca enfatizar e fortalecer os
vínculos culturais visando fortalecer a identidade desses moradores. Ainda
segundo Oliveira, “Já na perspectiva cultural, o território é uma expressão
simbólica, manifestação da identidade de um povo e local de construção dessa
própria identidade. Nessa linha há uma apropriação social do espaço por um
grupo que estabelece vínculos com ele através de um processo de vivência e
consequente valorização cultural. (2015, P.38)”
Tomando como base a
fenomenologia Heideggeriana, teríamos que esse “local de construção dessa
própria identidade” (2015, p.38), traduz indo o que o autor entende por
habitar, fenômeno que para ele não se reduz a morar ou residir, mas expressa a
própria existência. Nesse sentido, o “lugar”, o “território” onde habita um
povo expressa o seu modo de existir e de cultivar uma identidade.
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